sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Costeletas de Porco com Canela

O Dr. Teófilo Carvalho Sim-Sim era o médico residente de Vila Nova da Baronia, lá para as bandas de Beja. Verdadeiro médico rural, um João Semana, tinha criado, com os habitantes da freguesia,uma relação paternal e familiar, feita de uma vida de entrega e dedicação.
Entre a consulta da manhã e a da tarde, depois do almoço, ia sempre o Dr. Sim-Sim tomar "bica com cheirinho" ao Camões, restaurante veterano da aldeia, onde dava uma olhada ao cardápio do dia, escasso, mas onde sempre estavam as inevitáveies Costoletas de Porco. O doutor puxava então da esferográfica e emendava o segundo O para E. Aquilo tornou-se uma espécie de jogo: o sr.Inácio escrevia sempre costoleta e o Dr.emendava sempre para costeleta.
Um dia, no fim de semana o Dr. Sim-Sim foi dar uma volta a cavalo pelo campo, caiu e acabou por ter de ir tratar-se ao Hospital de Beja. Na Segunda Feira, apesar de ainda magoado, lá esteve a dar consulta e, depois do almoço, foi até ao Camões.
- Então doutor, que foi isso? - perguntou o Inácio ao vê-lo assim alquebrado.
- Sabe lá, Inácio! O alazão atirou-me ao chão e, olhe, parti uma costola!


Ingredientes:

Costeletas de porco, melhores as do cachaço, ou fundo
Sal, Pimenta, Alhos, Louro e Canela moída
Vinagre de vinho
Vinho branco
Banha de Porco

Preparação:

Tempere as costeletas com Pimenta, Canela, Alhos em fatias e Louro. Salpique com Vinagre e deixe durante algumas horas. A quantidade de Canela a utilizar é mais ou menos a que se usa de Pimenta.
Cerca de 45 minutos antes da refeição, retire os alhos e louro, aqueça bem banha de porco e proceda exactamente como foi descrito na receita anterior (Costeletas de Borrêgo Fritas), estando prontas quando os alhos tiverem desaparecido no molho.
Acompanha com Arroz de Manteiga, carolino, e salada servida em prato à parte. Se preferir ou quiser reduzir as calorias, também vai bem com bróculos escaldados al dente, que pode temperar, e bem com o molho da carne.

Notas:
Nunca consegui averiguar cabalmente a origem deste tempêro de carne de porco com canela, na cozinha da minha infância. É comum nas Cozinhas orientais, nalgumas regiões de Espanha e da Europa, mas totalmente ausente da Cozinha portuguesa, que era a fonte principal da culinária da minha mãe. Mas é uma delícia!

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Costeletas de Borrêgo Fritas

Na casa da minha infância não havia nenhum exaustor. O fogão ficava debaixo de uma grande chaminé que não impedia que o cheiro dos cozinhados se espalhassem um pouco por toda a casa, anunciando com antecedência as amenidades gustativas da refeição que se aproximava.
Neste tempo mais asséptico em que vivemos estes odores são geralmente mal conotados, mas naquela altura era perfeitamente normal e aceitável que uma casa cheirasse a comida à hora em que se comia. E, para mim, ainda é um prazer.
Falo nisto porque as Costeletas de Borrêgo que vou apresentar, além de excelentes em sabor, são, para a casa, uma verdadeira maravilha olfactiva, daquelas que fazem os vizinhos parar, lá fora, de nariz no ar a ver de onde vem aquele perfume.
Quando experimentar estas Costeletas, por favor, por uma vez, desligue o exaustor!


Ingredientes:

Costeletas de Borrêgo
Alho,Louro,Sal e Pimenta
Vinho branco
Banha de Porco

Preparação:

Deve rejeitar as costeletas que se vendem já embaladas e adquiri-las num talho com atendimento personalizado. As costeletas a usar são simples, ou seja são cortadas de metade de um vão de borrêgo e não do vão duplo que dá costeletas em forma de borboleta, boas para grelhar mas não para este prato. Deve ainda pedir ao talhante que corte as costeletas com metade da espessura normal, isto é, corta uma da espessura exacta do pé e a seguinte, sem pé, da espessura correspondente à distância que vai de uma costela à seguinte. O resultado é o dobro das costeletas, com metade da espessura.
Se quiser, dê um golpe com faca afiada ao longo da pele que forra o pé, do lado que não tem carne, e com o lado da faca que não corta solte esta carne deixando-a pendurada e o osso limpo.
Tempere as costeletas de um lado, com Pimenta, Louro e Alho fresco cortado em fatias não muito finas. Deixe pelo menos 1 hora, o ideal é de um dia para outro.
Cerca de 45 minutos antes da refeição, aqueça bem banha de porco numa frigideira, retire cuidadosamente todos os alhos e louro das costeletas e passe-as rapidamente, dos dois lados, 4 ou 5 de cada vez para nunca arrefecer a gordura. À medida que vão tomando cor, uns segundos apenas de cada lado, retire-as e ponha outras. Quando todas estiverem seladas, junte-as então na frigideira, junte os alhos e louro que tinha retirado, tempere de sal, adicione vinho branco e baixe o lume para médio.
Começa então um período longo de cozedura/fritura em que se deve deixar o vinho evaporar todo até recomeçar a fritar, altura em que se junta mais um pouco de vinho, num ciclo que se repete até os alhos se terem desfeito e desaparecido no molho,o que leva cerca de 30-40 minutos. Depois da última adição de vinho, deixe-o evaporar quase completamente,retirando do lume quando se começa de novo a ouvir o som de fritar, nas bordas da frigideira, mas ainda há sob a gordura alguma parte aquosa, concentrada e castanha, formada por algum vinho, os alhos e os sucos da carne.
O cheiro deve ser intenso e arrebatador; serve-se com puré de batata.

Notas:

Deve utilizar vinho branco, tipo seco e com alguma adstringência. Quanto à qualidade do dito,isto é assunto controverso, sou de opinião que se deve usar um vinho de mesa de qualidade média, melhor que vinho corrente de pacote de cartão, mas sem exageros, que vinho excelente é para ser bebido.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Filetes de Polvo

Estava um dia a minha mãe na peixaria de Magoito e ouviu alguém dizer que ia fazer polvo em filetes. Logo ali decidiu o que seria o almoço. Comprou um polvo bem grande, cortou-o em troços, passou por ovo e vai de fritar.
Esse foi o dia em que, pela primeira vez, a minha namorada almoçava com a minha família e, de repente, vejo-a já quase preta de sufocar, apavorada de aflicção e de vergonha, a levantar-se para deitar fora a bola dura e coriácea que teimava em não se deixar mastigar e engolir.
Eu já tinha reparado, mas eu engulo tudo.
É que a minha mãe só então percebeu que tinha de cozer primeiro o polvo. Foi uma risota e acabámos por comer uns ovos.


Ingredientes:

Polvo
Ovo
Azeite ou Óleo para fritar.
Sal e Pimenta
Sumo de Limão

Preparação:

Coza o polvo até ele estar bem tenro. Escorra e deixe esfriar.
Corte em troços de mais ou menos 10 / 12cm, abra ao meio as partes mais grossas e componha com a ajuda de 2 palitos uns filetes mais ou menos rectangulares, justapondo os troços de polvo. Tempere com pimenta branca moída.
Passe cada filete por ovo batido e frite até ganharem uma cor dourada, em lume esperto. Servem-se bem quentes,salpicados de sumo de limão e acompanhados por arroz de feijão.

Nota:
Se tiver oportunidade de comprar polvo no Norte, não hesite. O polvo melhora com a latitude: quanto mais acima, melhor. É (também) por isso que os filetes de polvo do Aleixo, ali junto à estação de Campanhã, são aqula maravilha inigualável, acompanhados por arroz, de feijão ou também de polvo.
E se gosta mesmo muito de polvo, suba um pouco mais e vá adquiri-lo à Galiza, na Ria de Vigo ou na de Padrón, o famoso Pulpo de Rias Bajas, um must!

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Filetes de Sardinha ou de Pelim

Estes "filetes", feitos de peixe pequeno, são na realidade peixes inteiros abertos, sem a espinha, que com a sua forma de pequenos bacalhaus, acabadinhos de fritar e acompanhados por um arroz de grêlos ou uma açorda fumegante, fazem uma refeição inesquecível.

Ingredientes:

Sardinhas ou Carapaus pequenos (+ ou - 10/12cm, maior que petinga ou joaquinzinhos)
Alho em pó
Sal e pimenta
Sumo de Limão
Farinha
Ovo
Óleo

Preparação:

Retire a cabeça e as vísceras aos peixes. Ponha um peixe sobre a tábua, agarre o côto de espinha que aparece no sítio onde estava a cabeça, com o indicador e polegar da mão esquerda, coloque a unha do indicador direito, a 45º sobre o início da espinha e faça deslizar em direcção à cauda, sempre encostada à espinha, fazendo soltar a carne que vai abrindo pelo lado da barriga e ficando presa pelo fio do lombo. O resultado é um peixe aberto, como um minúsculo bacalhau, ainda com a espinha no lado que fica à sua esquerda.
Passe a segurar a espinha com o polegar e indicador direitos e insira a unha do incador esquerdo sob a espinha e empurre de novo em direcção à cauda, ao mesmo tempo que puxa a espinha para cima. Ficará com o "filete" limpo e a espinha na sua mão direita.

Disponha com a pele para baixo e tempere com os tempêros indicados. Salpique com sumo de Limão mas não exagere, para que este não coza o peixe. Aguarde 1 hora.

Antes de fritar, opte por uma de 3 possibilidades: Panados (farinha, ovo, pão ralado), albardados (farinha e ovo) ou tempura (polme espesso).

Assim que chegam ao papel absorvente, são de novo salpicados, ainda muito quentes, com sumo de Limão.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Peixinhos da Horta

"... e peixinho da horta, não é peixe, é feijão!"

Outra delícia de antanho, do tempo em que as proteínas não apareciam muito pela mesa popular, que ia inventando estes peixes-feijão, para enganar e parecer que o prato não vinha todo da horta.

Hoje anda muito esquecido e arredado e, por vezes, é feito à "trapalhona", com o feijão verde cortado aos pedacinhos dentro de um polme e frito como se de patanisca se tratasse...


Ingredientes:

Feijão Verde grande, das variedades menos curvas.
1 ramo de Hortelã ou de Segurelha
Sal
Polme, feito com Ovo, Farinha, Sal, Pimenta e Água.
Azeite ou Óleo, para fritar.

Preparação:

Cortam-se os bicos e tira-se algum fio que os feijões tenham. Fervem-se durante poucos minutos em água temperada com sal e um ramo de Hortelã ou Segurelha. O tempo desta fervura varia consoante a variedade usada e deve deixar o feijão cozido de forma incompleta, ainda duro e com algum sabor a crú. Escorra bem.

Frite em Azeite ou Óleo, depois de passar os feijões, um a um ou dois a dois, conforme sejam grandes ou não pelo polme, que deve ser espesso. Escorra em papel absorvente. Sirva quente, embora sejam deliciosos para petisco, frios, no dia seguinte.

A Culinária

Tal como a Música ou a Poesia, também a Culinária se estuda, questiona, provoca e experimenta. Mas não se explica!

Sente-se!

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Parrameiros

O Zé Maria, com o seu triciclo, passava todo o Verão a vender bolos na Praia de Magoito e ainda corria as festas e feiras da região saloia à noite nos fins-de-semana.
Os bolos eram feitos pela sua mulher, durante a tarde e noite, numa garagem transformada em pastelaria, ( que faria qualquer digno agente da ASAE ter logo ali alguma coisa má), e de manhã lá estava ao cimo das escadas de acesso à praia, com as Bolas de Berlim, Queques, Mil-Folhas, Travesseiros (melhores que os da Casa Periquita, garanto), e umas ferraduras grandes que davam sustento para uma manhã inteira com o seu perfume a erva-doce e que davam pelo nome de Esparramêros.
Só muitos anos depois é que percebi, quando vi escrito, que afinal aquela maravilha se chamava Parrameiros. São assim:

Ingredientes:

1.15 Kg de Farinha de Trigo
40 g de Fermento de Padeiro
2 Ovos
100g de Margarina
1 dl de Água morna
0,5 dl de Leite
1,5 dl de Água
450 g de Açúcar
Raspa de 1 Limão
Gema de Ovo para pincelar
1 colher (chá) de Canela em pó
1 colher (sobremesa) de Erva Doce
Farinha para polvilhar

Preparação:

Num decilitro de água morna desfaça o fermento de padeiro e misture com 150 grs. de farinha, trabalhe esta masse e deixe levedar por 30 minutos aproximadamente.
Num recipiente coloque a restante farinha, abra-lhe uma cova no meio e insira aí a massa fermentada, vá trabalhando a massa e vá juntando a água e o leite. Seguidamente junte a canela, a margarina derretida, o açúcar, a erva-doce, a raspa da casca do limão e os ovos, amasse tudo muito bem. Forme uma bola, cubra com um pano e coloque a massa novamente a levedar.
Depois da massa ter levedado (aumentado de volume) volte a amassar. Retiram-se pequenas porções de massa que se tendem e enrolam, depois espalmam-se, esticam-se as pontas dando o feitio de ferradura ou meia lua.
Colocam-se num tabuleiro polvilhado de farinha e deixa-se descansar por mais 30 minutos.
Pincelam-se com gema de ovo e vão a cozer em forno pré aquecido a 200º C.


Notas:

A erva doce pode utilizar-se moída em pó, o que facilita bastante o uso, mas, originalmente, quando apenas se vendia em grão, era esmigalhada num almofariz e depois adicionada à massa, o que dava como resultado encontrarem-se na boca, bocadinhos da semente com um sabor forte a aniz e que conferia aos Parrameiros um toque "étnico" muito poderoso.

Pastéis de Massa Tenra

Um jantar de Pastéis de Massa Tenra era uma festa que começava, na realidade, logo depois do almoço, quando a minha mãe preparava as carnes para o recheio (era eu que manobrava a manivela de uma velha máquina de picar, Huskvarna, linda).
Depois, lá para a hora do lanche, entrava em cena a Gina, que era a "especialista" da massa. Durante mais de uma hora eu seguia maravilhado toda aquela alquimia em que a farinha se transformava numa massa que esticava mais de um metro sem partir, depois de uma sova de proporções bíblicas. Penso que foram estes Pastéis e a sua preparação, os responsáveis pelo meu interesse por estas coisas da Culinária e Gastronomia, tão pouco comum nos homens, nessa época. Hoje é perfeitamente normal mas, há quase 50 anos, era coisa que se olhava de soslaio!
Lá para as sete e meia começava a fritura, onde eu podia comer logo, a ferver, um ou outro que rebentava e ficava sem apresentação para a mesa. Depois era a festa da refeição, a travessa enorme, cada um a escolher os seus preferidos, ou com mais recheio ou, como eu, a pedir os com a massa maior e mais tufada, com mais "paisagem", dizia o meu pai. Tudo acompanhado por um cremoso arroz de manteiga, salada e pikles de couve-flor.
Desde então tenho passado a vida a tentar igualar esta massa única, mas o melhor que consegui foram aproximações. Servem para lembrar que, em culinária, há sempre algo que ainda falta aprender.

Ingredientes:

500g de Farinha de Trigo fina, com fermento
20g de Banha de Porco
3 colheres de sopa de Azeite Virgem
Água morna q.b.
Sal q.b.
Azeite refinado ou Óleo, para fritar
Recheio de Carne

Peneire a farinha para uma tigela, despeje-a em monte sobre a pedra e abra um buraco largo a meio. Aqueça as gorduras moderadamente, numa frigideira, e deite no buraco da farinha. Quando deixar de borbulhar, misture tudo com os dedos e comece a juntar, a pouco e pouco, a água morna em que dissolveu o sal, até obter uma consistência que permita começar a trabalhar a massa (sovar) sem que ela se pegue à pedra. Depois é trabalhá-la e batê-la sem piedade, até ficar elástica. Durante esta verdadeira sova, a massa vai ficando mais dura e é necessário juntar, sempre aos poucos, mais água; faz-se molhando os dedos e furando a massa com as pontas dos dedos molhadas, dobrando-a e voltando a sovar.
Está pronta quando puder pegar entre as mãos e puxá-la até ficar com os braços abertos, sem que ela se parta.
Antes de tender a massa deixe-a descansar pelo menos uma hora.
Depois estende-se fina com rolo de madeira enfarinhado, dispõe-se o recheio e cortam-se os pastéis com uma carretilha, dispondo-os sobre um tabuleiro forrado com pano, para não pegar.
Fritam-se em azeite ou óleo bem quente e escorrem-se em papel absorvente.

Notas:

Quanto ao recheio, existem muitas possibilidades. Aqui manda o gosto individual: em casa dos meus pais, utilizava-se por vezes carne de vaca estufada ou assada, de sobra, desfiada grosseiramente e ligada com um bechamel firme ou com leite e pão ralado, mas, a maior parte das vezes, massa de carne de Croquete, deixada um pouco mais mole, que é a primeira receita postada neste blog. Mas a alma de um Pastel de Massa Tenra é .... a massa tenra!

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Arroz de Grêlos (de nabo)

O Arroz de Grêlos, feito com os amargos e floridos Grêlos de Nabo, são um acompanhamento "adulto", (raras são as crianças que o suportam), excelente e requintado com qualquer peixe frito ou carne assada que não tenha tomate no molho.
Este arroz, ao contrário do que se vai encontrando cada vez mais por aí, deve ser apenas semi-malandro, isto é, húmido mas nada de exageros nem escorrências pelo prato.

Ingredientes:

1 molho de Grêlos de Nabo com bastante flor.
1 chávena grande de Arroz Carolino
2 chávenas de água
4-5 dentes de alho
1 folha de louro
3-4 colheres de sopa de Azeite Virgem
Flor de Sal e Pimenta q.b.

Preparação:

Arranje os grêlos aproveitando a parte das flores e as folhas, rejeitando as partes mais duras do talo. Lave, escorra bem, pese e reserve.
Aqueça o azete num tacho e frite ao de leve a folha de louro e os dentes de alho. Assim que os alhos começarem a ganhar uma ligeira cor amarelada, retire-os e reserve-os.
Introduza os grêlos, tempere com a Flor de Sal e a pimenta e passe-os durante pouco tempo em lume forte, mexendo sempre até os grêlos ficarem moles. Adicione a água, à qual deve antes retirar uma quantidade equilvalente a metade do peso dos grêlos e reintroduza os alhos. Ponha o arroz, mexa, deixe levantar fervura, tape e reduza o lume ao mínimo.
Ao fim de 10 minutos, apague o lume, deixe tapado e espere mais 5 minutos. Adicione então a água fria correspondente a metade do peso dos grêlos que tinha retirado ao princípio. Mexa bem e sirva sem grande demora.

Notas:

1 - O Arroz Agulha e qualquer arroz sem goma, são totalmente inadequados para este prato. Deve utilizar-se o Carolino ou um arroz de bago curto e gomoso como o arroz italiano para risotto ou arroz para sushi, sem lavar.
2 - Na cozedura de um arroz com legumes, estes devem ser pesados em crú e metade do seu peso descontado na quantidade de água. Sem este cuidado, a água que os legumes libertam durante a cozedura torna-se demais e o arroz fica espapaçado.

AS GRANDES OPÇÕES - 1

Tempêros e Sabores - Sinfonia ou Música de Câmara?

Os tempêros e especiarias podem ser auxiliares preciosos para a obtenção da plenitude das potencialidades gustativas de muitos alimentos.
Assiste-se no entanto, com a proliferação das cozinhas de fusão e a procura de exotismo, a uma invasão do espaço gastronómico por verdadeiras orgias de sabores fortes e marcantes, que transformam o alimento base num suporte para tempêros que, de algum modo, se tornam as estrelas da refeição!
Esta cozinha dos tempêros tem, naturalmente, a sua razão de ser: oriunda na sua esmagadora maioria, de climas tropicias ou sub-tropicais e de culturas com meios rudimentares de conservação, tornou-se uma necessidade, quer para prolongar a duração do alimento até ser consumido, quer para disfarçar os vestígios olfactivos da sua inevitável deterioração.
Se é verdade que essa procura deu origem a verdadeiras sinfonias gustativas, como por exemplo a mistura de tempêros a que se dá o nome genérico de Caril, também não é menos verdade que, na boca, um caril de frango, de galinha ou até de porco, sabe ao mesmo!
Quando cozinho, essa é a minha primeira grande opção: Quero um prato em que os tempêros sejam as estrelas (sinfonia em grande orquestra) ou em que a carne, o peixe ou o vegetal sejam os reis (Quarteto de Câmara)?
Chamo-lhe quarteto porque raramente esta cozinha dos sabores simples e poderosos que cada alimento encerra, necessita de mais de quatro sabores (sal e pimenta já incluídos) para soltarem todas as suas notas gustativas.
É essa a razão porque, por exemplo, na receita que publiquei de Sopa de Peixe, o pimento e o piripiri são opcionais; é que se usar a delicadíssima garoupa, o seu sabor único fica afogado na intensidade destes tempêros. E a sopa é de peixe, não de pimentos e piri-piri!

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Omoleta de Coentros

As omoletas são muitas vezes consideradas, com a maior injustiça, como aquele prato rápido e simples que qualquer um sabe fazer. Acontece aliás o mesmo com a maioria dos pratos à base de ovos; como o ovo é generoso e mesmo todo maltratado, dá sempre qualquer coisa que se deixa comer, perdeu-se a noção que, apenas por serem feitos, com técnica e rigor quase obsessivos, os pratos de ovos podem ser também obras primas que ombreiam com as maiores do universo gourmet.
Em 1994 António Tabucchi escreveu Afirma Pereira, que seria passado ao cinema em 1996. Nesse belíssimo filme, a personagem principal, interpretada por Marcelo Mastroianni, tinha uma obsessão por omoletas de coentros.
Nunca encontrei este prato descrito, mas parti à sua descoberta e o resultado das experiências foi uma omoleta de uma delicadeza espantosa, que não mais se esquece.

Ingredientes:

Por pessoa :

3 Ovos
3 colheres de sopa bem cheias de coentro fresco picado fino.
1 colher de sopa de Água
1 pitada de Flor de Sal
1 pitada de Pimenta Branca moída na altura
1 colher de café de Banha de Porco.

Preparação:

Bata os ovos com a pitada de Flor de Sal, a pimenta e a Água. Junte os Coentros picados, misture e reserve.
Derreta a banha de porco numa frigideira anti-aderente, pesada, untando todo o fundo com a banha derretida. Deite metade dos ovos na frigideira e baixe o lume para médio (se não tem ainda experiência de enrolar omoletas, baixe ainda mais, para ter tempo).
Quando os ovos começarem a estar cozidos nas bordas, com o auxílio de duas espátulas de madeira, puxe a "bolacha" que se formou para si, de modo a que fique levantada junto ao bordo da frigideira. Quando faz esta operação, o ovo que ainda está crú, por cima, escorre para a parte da frigideira que ficou livre, mais afastada de si, e começa a a fritar por sua vez.
Dobre então a parte da omoleta que puxou e ficou levantada, sobre a parte do fundo da frigideira. Puxe de novo, agora a parte dobrada, para o bordo da frigideira, deixe escorrer o ovo ainda crú, dobre, etc.
Quando vir que o ovo já nã escorre quando puxa a omoleta, deite metade do que restou na tigela, de modo a poder continuar a enrolar e, por fim, o resto do ovo. Enrole a omoleta até ao fim, levante o lume ao máximo e dê uma volta à omoleta de modo a ganhar uma cor dourada, rápida. (se ficar muito tempo neste acabamento final, fica demasiado cozida e seca). Sirva logo.

Notas: Não faça omoletas para mais de 2 pessoas (3 ou 6 ovos). Se precisar faça várias omoletas.
Para 6 ovos utilize uma frigideira de 26-28cm, para 3 ovos uma de 17-19cm.
Se não tem prática de enrolar omoletas, é possível que esta fique pronta com 3 ou 4 voltas. Não desanime e, para a próxima vez, baixe mais o lume. A excelência da omoleta aumenta com o numero de voltas que, por sua vez, aumenta a humidade interna e a intensidade do sabor do ovo. A questão é que, quanto maior o número de voltas, mais fina é a camada de ovo cozida e logo, maior o risco de romper quando puxa. Se acontecer, não desanime, deixe fritar o ovo que derramou para trás, enrole de novo e continue. Só a última volta é que condiciona o aspecto da omoleta e essa já é muito fácil. :-)

Esta omoleta pode ser acompanhada por qualquer dos acompanhaamentos tradicionais para ovo frito, batatas fritas, arroz branco, legumes, saladas. Eu nunca consegui descobrir nada que não a desvalorize e ... como-a só!



sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Pastéis de Bacalhau (bolinhos)

Quando, há 40 anos, eu estava a entrar na adolescência, ninguém fazia Pastéis de Bacalhau como a Tendinha do Rossio, em Lisboa, mesmo ali ao lado do Arco Bandeira e do Animatógrafo.
Fosse qual fosse a hora, aquilo era uma obrigação quase religiosa e, se fosse sem companhia adulta, com o Pastel seguia um copinho de Três de branco, de que eu até não gostava mas que era como fazia a gente crescida...
Voltei à Tendinha após um interregno de décadas e, horror, seja culpa de ganância, de ignorância, ou até da ASAE ;-), os pastéis são agora uns massarocos infames de batata, com um sabor vestigial a um peixe sêco qualquer e até os copinhos de branco, chamam-se agora "taças". Iac!!!

Ingredientes:

300g de Bacalhau corrente (pesado depois de demolhado)
0,5 Kg de Batatas
3-4 Ovos
1 ramo pequeno de Salsa
Sal e Pimenta
Azeite refinado ou Óleo ou mistura de ambos, para fritar.

Preparação:

Demolhe o bacalhau e dê-lhe uma fervura rápida durante cerca de 1 minuto. Escorra.
Ponha as batatas a cozer com casca, (pode aproveitar a água quente onde ferveu o bacalhau), retire-lhes a pele e esmague-as num espremedor de puré ou, na falta, com um garfo, mas nunca com uma varinha ou outro dispositivo rotativo, que transforma a batata numa cola.
Retire espinhas e pele ao bacalhau e ponha a carne dentro de um pano de cozinha. Ate as pontas e sove o bacalhau, dentro do pano, batendo, amassando e esfarelando durante o tempo necessário para que este se transforme numa bola de fibras finíssimas como cabelos e emaranhadas.
Junte o bacalhau à batata esmagada, tendo o cuidado de abrir a bola de fios em que o bacalhau se tranformou, com os dedos, para facilitar a mistura. Adicione 3 dos ovos, mexa bem, se vir que aguenta sem ficar muito líquido, junte então o quarto ovo. Junte então a salsa picada, mexa bem, prove, rectifique o sal e a pimenta e volte a mexer.

Molde os pastéis com a ajuda de duas colheres de sopa, (se nunca viu fazer, tem de perguntar a alguém que saiba, lamento, mas é um conjunto de movimentos em que a massa vai passando de uma colher para a outra, inexplicável por escrito), e frite em gordura bem quente, até adquirirem uma bela cor dourada. Escorra em papel absorvente e sirva quentes ou mornos.
Acompanha com arroz de tomate meio malandro (carolino) e salada crua ou, melhor ainda, com Arroz de Grêlos que, a propósito,antes que esqueça, será a minha próxima receita.

Notas: O resultado final dos pastéis depende muito da consistência da massa antes de fritar, que, por sua vez, depende muito da qualidade da batata, muito variável. (prefira batatas velhas e variedades para cozer)
Se lhe acontecer que a massa fica muito mole para conseguir moldar bem, não tente fritar assim, porque o desastre é certo. Junte à massa, aos poucos, para poder controlar, puré de batata instantâneo, em flocos, para absorver o excesso de humidade e dar à massa a firmeza necessária para poder ser moldada com as colheres.

Sopa de Peixe com Massa (refeição)

Há muitos anos, fui almoçar a uma taberna (à séria) no Monte do Trigo. Só havia bife e sopa de peixe e, perante tal cardápio, mandei vir as duas coisas. Ainda lembro a expressão atónita do taberneiro, mas, na altura, não liguei.
Minutos depois percebi: a Sopa de Peixe também era, por si só, uma refeição completa , e que refeição. Só um verdadeiro alarve conseguiria comer um bife depois de tal "sopa". Lá consegui parar o bife a tempo.


Ingredientes:

2 ou 3 cabeças de Peixe Espada
2 Carapaus grandes ou outro peixe de carne mole.
600g de Corvina, Perca do Nilo ou outro peixe de carne firme.
1 Pimento Verde pequeno (opcional)
1 Tomate maduro
2,5 dl de Polpa de Tomate
3-4 dentes de Alho
1 folha de Louro
2-3 bagas inteiras de Piri-piri (opcional)
250g de massa Cotovelinhos
Azeite Virgem, Sal, Pimenta, Poejo fresco ou, na falta, Hortelã.


Preparação:

Quando comprar peixe-espada, branco ou preto, peça a cabeça, à qual se devem retirar as guelras. Se perguntar se lhe arranjam mais uma ou duas, das que os outros clientes não quiseram levar, obtem facilmente, e grátis, esse ingrediente essencial.

Coza durante 30m, em lume brando e água abundante, as cabeças de Peixe-espada e o peixe mole. Ao fim dos 30m, introduza o peixe de carne firme, tape e apague de imediato o lume.

Refogue em azeite, muito ao de leve, os dentes de alho esmagados com a casca e o tomate cortado em pedaços grosseiros. (este tomate serve para dar uma aparência mais genuína à sopa, embora a sua espessura e aveludado sejam obtidos com o tomate em calda).
Junte então a calda de tomate, o pimento cortado em tiras finas (opcional), a folha de louro, a pimenta e as bagas de piri-piri (opcional). Não deixe refogar estes ingredientes; apague o lume.

Vá de novo até à panela onde estão os peixes, retire-os com uma escumadeira e separe cuidadosamente a carne das espinhas e peles. A carne dos peixes moles e das cabeças deve estar meia desfeita pela cozedura, é normal e desejável, e a dos peixes duros deve estar bem firme, por nunca ter levado fervura. Deixe o peixe firme em bocadinhos agradáveis e que caibam bem na colher, mas não corte com faca, desfie sempre com os dedos. Reserve.

Côe por um passador de rede a água da cozedura, que deve ter um aspecto meio leitoso, para a panela dos vegetais, mexa, tempere de sal e ponha de novo ao lume. Quando levantar fervura adicione a massa e deixe cozer por 8-10m. Quando a massa estiver a seu gosto, apague o lume, junte o poejo ou hortelâ e, de seguida, o peixe desfiado. Mexa, tape, espere 5 minutos e sirva de imediato.

Notas: O tempêro de excelência para esta sopa é a Hortelã da Ribeira, uma variedade de menta que só conheço no Alentejo e, mesmo assim, não à venda. Por isso não a indiquei na receita.
Apesar de eu achar que a massa é um "must" para a sopa de peixe, pode também comê-la ao modo Alentejano, isto é, em vez de massa, faz um "ensopado", sobre fatias de pão duro e firme. Se optar pela variedade com o pão, deixe ferver o caldo como se estivessem lá as massas, para cozer o pimento e os outros tempêros.
Não me esqueci da cebola; as sopas de peixe com cebola ficam sempre com um sabor aparentado com molho de caldeirada, que não é o que se pretende.
Faça bastante sopa; pode ter a certeza que nunca sobra!